“Esse, praticamente, é meu lema e o que usamos como mantra na ONG que administro por ser primeira-dama, o RioSolidario. Sempre encarei os problemas de frente, pensando na solução, ao invés da dificuldade em si, mas, claro, nem sempre é assim. Algumas vezes, a força da realidade nos tira o chão: uma delas foi quando visitei as pessoas que viviam na antiga fábrica da CCPL, em Benfica, na Zona Norte, anos atrás. Apesar de sempre estar envolvida com as questões sociais, reconheço que a visita foi impactante e que saí dali muito sensibilizada, quase esmoreci. Centenas de pessoas morando em condições insalubres, sem segurança ou condições mínimas de dignidade. Conversei com eles, ouvi suas necessidades e visitei suas moradias. Mas o que mais me marcou foi observar aquelas crianças e jovens brincando no meio do esgoto, nos bolsões de água empoçada. Eles deveriam estar na creche, na escola. Os adolescentes, no contraturno do colégio, deveriam estar em algum curso de capacitação, profissionalizante, na Faetec etc.
Ao longo da minha vida e da minha carreira no setor público, já presenciei muitas situações marcantes, no entanto, de alguma forma, aquelas imagens me impactaram profundamente. Muito. Decidi que precisava fazer algo; aqueles jovens precisavam de uma ocupação. Precisavam ter acesso ao que é dignidade e cidadania. Como fazer para dar certo? Precisava reagir. Não foi fácil assimilar aquela experiência. Mas, como sempre, tive fé em Deus e, assim, idealizei o projeto Futuro Agora, que tem na educação a capacidade transformadora do futuro das crianças e jovens. É uma gota no oceano, tenho convicção disso, mas, ao assumir a presidência do RioSolidario, desenhamos o que se tornou um projeto de sucesso, que já capacitou milhares de jovens para o mercado de trabalho e para vários cursos de capacitação, implementou um Banco de Talentos com mais de 5 mil inscritos e que são direcionados para as vagas disponibilizadas pelos parceiros. Mais de 600 crianças são atendidas em três creches: Vila do João, na Maré; Cidade de Deus e Batan, que empregam apenas moradores locais.
Reconheço que, por ser uma ONG, avançamos bastante. Mas aprendi também, como ser humano, que, para fazer a diferença na vida de quem precisa, às vezes, uma palavra, um gesto de carinho ou um simples “escutar” podem ser grandiosos para aquela pessoa. Vivemos numa sociedade em que o individualismo está quase imperando. Desenvolver a empatia e agir, de acordo com a necessidade apresentada, pode ser o fator transformador nas relações humanas e, até mesmo, para problemas da nossa sociedade, como preconceito social e étnico, pobreza extrema, intolerância religiosa, ente outros. Hoje, ao brincar com meu neto Pedro, de 2 anos, em alguns momentos me surpreendo lembrando aquelas crianças da CCPL. O brilho nos olhos deles é o mesmo: são crianças. O futuro é que era incerto. Espero ter feito a diferença na vida deles; eles fizeram em mim.
Maria Lucia Jardim é a primeira-dama do Rio, presidente do RioSolidario e criadora do projeto “Futuro Agora”. Seu mandato vai até dia 1º de janeiro, data em que acaba o governo do marido, Luiz Fernando Pezão.