As pessoas dizem que família é bom em porta retrato. O que dizer de vizinhos então? A forma contemporânea de “l’enfer sont les autres” amplia-se com a presença indesejada nos elevadores, nos plays, nas garagens, na área comum. E quando vem alguma crise, afloram-se todas as patologias também ampliadas. Ao tratar de uma mudança coletiva por uma desapropriação para transformar o prédio em um aquário, “A Vida ao Lado”, no Teatro Serrador, coloca tudo isso num balaio só.
Com texto e direção de Cristina Fagundes, a peça vai moldando a partir de quatro núcleos, três famílias disfuncionais e o porteiro o crescimento das neuroses e obsessões. Das mais comuns hoje, como uma mulher de 60 anos que mente nos aplicativos de encontros, até relações totalmente sadomasoquistas, uma mulher ninfomaníaca. Cabe tudo na busca de se encontrar um lugar na vida ao mesmo tempo em que se está obrigado a procurar um lugar para viver.
O elenco formado por Alexandre Barros, Alexandre Varella, Ana Paula Novellino, Bia Guedes, Cristina Fagundes, Flávia Espírito Santo e Marcello Gonçalves se multiplica nos diversos papéis para contar as narrativas de cada recorte de trama. Essa mudança de personagens funciona muito bem, sobretudo quando a ação passa dos adultos para crianças.
A Vida ao Lado, apesar de o título chamar atenção para o que ocorre com o outro que está próximo e que não percebemos, fala daquilo que está dentro de cada um e que em contato com o vizinho acaba por aflorar. A opção de não se ter um cenário, apenas um fundo formado por luminárias, e os figurinos igualmente cinza leva o espectador a perceber que, infelizmente, a vida ao lado é falsamente iluminada.
Serviço:
Teatro Municipal Serrador
Quintas, Sextas e Sábados
às 19h30