Todo mundo cita Nelson, fala de Nelson, ri nervosamente e chora com a dor que parece não acabar. O pornógrafo, o tarado, o que só fala de incesto, de sexo de todo jeito é o mais festejado autor brasileiro. Ele mesmo Nelson Rodrigues, pernambucano, carioca, Fluminense mais pó-de-arroz do mundo, de direita, jornalista, cronista. Amado, odiado, xingado. Nelson Rodrigues de “Perdoa-me por me traíres”, em cartaz no Teatro Laura Alvim.
Um clássico, peça escrita há exatos 60 anos, parece ter saído do Facebook ou do Instagram. Em uma trama que mistura tio, mãe, sobrinha, pedofilia, prostituição, aborto,”Perdoa-me por me traíres” funciona como um pêndulo que vai para um lado, para o outro mas sempre pesando na perda. Com elenco formado por Bebel Ambrosio, Bob Neri, Clarissa Kahane, Ernani Moraes, Gabriela Rosas, João Marcelo Pallottino, Rose Lima, Tatiana Infante e Daniel Herz, sob a direção de Daniel Herz , a peça gira em torno de todo o tipo de traição: casamento, amizade, trabalho, relações de poder.
Sobre o que o estimulou a trabalhar nessa nova montagem, Daniel Herz, que já dirigiu também a obra “Valsa nº 6”, do mesmo autor, explica: “Nelson é universal e por isso sempre atual, mas é importante não deixar a singularidade do ´sotaque´ rodriguiano parecer uma cena cheia de naftalina. Manter a linguagem, mas parecer que ela é dos nossos dias, do nosso momento histórico. Esse é o grande desafio”. Daniel acredita ainda que Nelson se repete com uma originalidade incrível e que dirigir “Perdoa-me…” é virar um pouco todos eles: a doença e a paixão que cada personagem carrega. Para finalizar Herz ainda diz “Ele é o nosso Shakespeare. Genial. Único! Poderia ficar o resto da vida só montando Nelson.”
O cenário de Fernando Mello da Costa são venezianas que se abrem e fecham como fazem exatamente nossos olhos e ouvidos quando não queremos saber daquilo que não queremos saber. Mas a talentosa e clássica direção de Daniel Herz valoriza e destaca o trabalho dos atores o que faz com que as reações ao texto aconteçam exatamente como deve acontecer. E ficamos a pensar: atire a primeira pedra quem não traiu? Ou quem nunca criou uma situação para ser traído? E além do mais, perdão foi feito para a gente pedir.
Serviço:
Casa de Cultura Laura Alvim
Sextas e Sábados às 21h
Domingos às 20 horas