Costumo dizer que se fizesse uma estatística nas redes sociais, o diálogo campeão seria: Ele não falou comigo.” “Então, migx, dá desprezo”. Mas antes de o conselho ficar tão acessível, as pessoas se utilizavam do Correio Sentimental, escrevendo para jornais, rádios, revistas. É dessa relação de confiança, de entregar a alguém, mesmo qu seja uma estranha que trata “Myrna Sou Eu – Consultório Sentimental de Nelson Rodrigues”.
Nilton Bicudo, travestido nos figurinos e nas maneiras idealizadas da década de 50, faz Myrna, um avatar criado a partir das crônicas de Nelson Rodrigues, escritas no jornal “Correio da Manhã“. Elias Andreato, o diretor, desloca a situação para um programa de rádio no qual a apresentadora vai além de ler e responder a cartas. Myrna é uma profetisa, uma psicanalista-interventora, que narra, cutuca, comenta, critica. E responde num primeiro nível com o consultado, ainda que o seu verdadeiro diálogo seja com o público.
O tema permanece o mesmo passado 60 anos: amores, amores, parceiros, parceiras, homens, mulheres. , amantes. Aquilo que ocupa o tempo, a mente e coração das mulheres. E o que s fazem com a nossa alma, nossos corpos. É para essa alma o texto de Nelson Rodrigues que, sarcasticamente, nos coloca no lugar da finitude dos relacionamentos.
Nilton Bicudo dá voz, corpo, trejeitos e ar a Myrna, uma mulher que chega a um momento em que tem de encarar sua própria trajetória. Um amor da vida que lhe volta ao vivo, mas sem cores, pois é um ouvinte que fala com ela. Muda os padrões, os conselhos, mas sabiamente se rende. E o final não é rodriguiano, mas é o que todos nós sonhamos: “e viveram juntos para sempre”.
SERVIÇO:
Local: Teatro Poeira
Terças e quartas às 21h.