Não é de hoje que o palavrão existe. No Brasil, há muitos anos, ainda na época da ditadura, era considerado libertário e, no teatro, muito bem aceito. Também viveu sua fase no cinema brasileiro – filme que não tinha alguém falando era caso raro. Com a abertura do regime e educação mais liberal, foi se popularizando, a ponto de perder a aura de proibição: tornou-se comum nos estádios de futebol e até na televisão, como uma expressão normal de desabafo. Num convívio de intimidade é usado por muitos também. Mas o que explicaria o seu uso em excesso, quase como vírgula, nas gravações vazadas recentemente nas conversas entre políticos? Por que pessoas que, teoricamente, estão numa situação “mais elevada” preferem essa linguagem quando sabem que não estão sendo observadas pelo público?
Com a palavra, o psicanalista Luiz Alberto Py:
O que significa essa onda de palavrões?
“É cultural. Determinado grupo de pessoas utiliza muito essa linguagem chula até para sublinhar a descontração. Normalmente, a gente reprime; numa conversa informal, pode significar desrepressão. Comparando, é como muitos homens gays que freiam o jeito mais desmunhecado de ser, por exemplo, no trabalho, mas, num momento mais descontraído, ele se solta.”
E no caso dos políticos?
“Os políticos passam o dia inteiro no trabalho muito contidos, juntando a isso que alguns parece que gostam, como é o caso do Lula. Se eu fosse falar com o ex-presidente, eu usaria a linguagem dele: “Porra, Lula, e aí?” A gente imita o comportamento do outro, de igual para igual.”
Palavrão transmite o quê?
“Transmite raiva, que é gerada pelo medo. A raiva é filha do medo. E uma das formas de expressar raiva é falar palavrão, ou dar soco na mesa, falar alto, abusar dos gestos e também ficar “rubro de raiva”. Quando a pessoa fala palavrão, está sendo espontânea – o espontâneo tende a ser mais transparente.”
Alguma associação entre o palavrão e a fase atual da política?
“Ha um momento de muito medo na política. Os políticos andam todos bem amedrontados; suas carreiras estão sendo postas em questão. Mas, quanto a falar palavrão, a gente não consegue imaginar alguns deles falando, como o Temer, por exemplo. E os mineiros, também, dificilmente falam – costumam ser cuidadosos com as palavras. É parte da cultura mineira.”