Ricardo Nauenberg, que vai lançar livro e fazer exposição sobre a parte das obras do metrô (a que a gente não vê), já está com muito mais que as 100 imagens de que precisaria, cada uma mais impressionante que a outra, segundo consta. Ricardo considera mais importante a parte das escavações, ou seja, já fotografada, mas, talvez por preciosismo, segue a postos, digamos assim, até o último momento. As fotos serão apresentadas em uma exposição durante as Olimpíadas do Rio, em agosto.
Formado em Design, Arquitetura e Economia, Ricardo começou sua carreira como fotógrafo de moda. Foi diretor de arte da TV Globo, participando das vinhetas e aberturas de alguns programas da emissora por 10 anos, entre 1980 e 1990. Na mesma época, trabalhou como diretor de programas de ficção, além de videoclipes para o “Fantástico”. Em 1988 fundou a “Indústria Imaginária” (que produz conteúdos de comunicação) e, com a solidificação da empresa, desligou-se da Rede Globo como funcionário, mas sempre mantendo relações profissionais.
Logo no primeiro ano de independência da “Indústria Imaginária”, Ricardo engajou-se na montagem da TVA, primeira TV a cabo no Brasil (propriedade do grupo ABRIL), e no desenvolvimento de série de ficção para a Rede Manchete.
Em 2013, lançou seu primeiro longa de ficção no cinema, “O Inventor de Sonhos”, além da série “Áudio Retrato”, com documentários dirigidos por ele, onde, inicialmente, 12 músicos, um por filme, narrariam assuntos que tivessem vivenciado. O resultado foi tão bom que continuou. A cantora Anitta foi a participação mais recente, no 22° documentário.
Ricardo, você que é tão multimídia, não deu vontade de fazer também um documentário sobre as obras da expansão do metrô carioca, além do livro e exposição de fotos?
“O projeto nasceu de uma saudade dos meus tempos de fotógrafo, depois de assistir a “O sal da terra”, documentário sobre Sebastião Salgado. Filme e TV são produções complexas, com equipe grande, executivos, distribuidores, contratos, com boas doses de tensão a serem administradas. A fotografia é tão somente você e a câmera, seu olhar, o previlégio de uma decisão totalmente pessoal e instantânea.
Ao passar pela obra do metrô no Itanhangá, percebi que havia um tema épico a ser explorado, com todos os elementos geográficos, estéticos e humanos, com ainda um “agravante”: é uma paisagem subterrânea que, mesmo se as pessoas tivessem acesso, iria desaparecer depois de pronta. Achei que era um tema e tanto para um ensaio pessoal, fotográfico, e não caberia um filme, caso contrário, deixaria de ser intimista.
Comecei por puro exercício, para compartilhar as surpresas que encontrei. Iniciei publicando fotos no Instagram. Para minha surpresa, editoras me ligaram, perguntando se eu não queria publicar um livro com as imagens – o que era um exercício pessoal virou um projeto de livro e de uma grande exposição.”
Você chegou a comparar o ambiente de trabalho das obras do metrô a uma Serra Pelada. Como é a rotina desses funcionários? É necessária uma certa dose de coragem para trabalhar nos subterrâneos cariocas? Quem tem claustrofobia está fora? (rs)
“A obra tem nos trabalhadores verdadeiros heróis. O ambiente é muito quente, úmido, o ar, saturado de poeira, quase irrespirável (isso as fotografias não passam, e portanto quase romanceiam o ambiente). As condições são naturalmente muito duras, apesar de haver uma grande preocupação com segurança e em se assegurar, dentro do possível, o maior conforto. É muito cansativo para mim… Imagine para quem trabalha com esforço físico. Estão todos de manga comprida e capacete (questões óbvias de segurança). Difere de Serra Pelada porque você sente a preocupação com segurança e a tutela da companhia construtora, enquanto em Serra Pelada isso existe dessa forma. Sob o aspecto épico, é parecido… É um megacorte na crosta da terra e uma obra monumental. Sob o aspecto dos objetivos, também é diferente: o metrô é uma obra de mobilidade urbana para melhorar a vida da população e nasce de uma necessidade social; Serra Pelada é extração com pouca preocupação com o meio ambiente.”.
O que mais o impressionou nesse seu projeto? Houve alguma situação em que você também teve que se arriscar para tirar uma foto com perspectiva de cima etc?
“O impressionante são as dimensões “bíblicas” – são inúmeros detalhes comparáveis a um quadro do pintor Bruegel. Visualmente, é difícil descrever porque, no final, a fotografia e o ambiente são realidades distintas – fotógrafo principalmente, com as lentes 600 mm (que achata os planos) e com uma 14 mm (que alonga os planos), o que distorce a realidade um pouco. Importante dizer que o projeto não tem nada de jornalístico – é artístico. A obra é um tema para se explorarem cores e formas, sob um ângulo totalmente de grafismo.
Quanto às situações de perigo, elas não existem porque a segurança é um assunto tratado com muita atenção. Os locais de acesso são muito demarcados, e as ações (explosões, movimentação de guindastes etc.) são rigorosamente anunciadas e controladas. Existe uma doutrinação constante para que os trabalhadores respeitem as normas, o que, pela nossa cultura, nem sempre é fácil.”.
Depois de ter dirigido tantos videoclipes para o “Fantástico”, o que você acha do atual mercado da música? Sente saudades das imagens ligadas ao som?
“Atualmente dirijo um programa (já em terceira temporada, no “Multishow” e “Bis”) que é uma mistura de música e documentário, chamado “Áudio Retrato”. Por ele, já passaram 22 artistas (Gil, Lenine, Frejat, Elba, Fagner, Dinho Ouro Preto e tantos outros). E estou começando um projeto novo para o canal Arte 1, com o Liminha, sobre o “Nas Nuvens” e os maiores hits dos inúmeros artistas que ele produziu, de forma que não houve tempo para saudades, uma vez que música está muito presente nesses projetos todos. O mercado de música mudou enormemente com a Internet e inovações tecnológicas de gravação, que achatou o poder das gravadoras. Na TV, a MTV não tem mais o papel que tinha, e são cada vez menores os espaços para música pura. “Áudio Retrato” e “Nas Nuvens” trazem uma outra abordagem, que é misturar música com “story telling”, fusão de melodia com documentário em programas de 60 minutos. Talvez por esse olhar diferenciado, tem sido bem recebido.”
Na sua vida do dia a dia, a tecnologia tem trazido muitas vantagens?
“Enormemente… Sou fã da tecnologia quando bem utilizada. Ela proporciona liberdade criativa e de informação. No passado, para editar um programa de TV, era uma sala com vários participantes; hoje é você e um laptop, fora a sensibilidade das câmeras de tamanho reduzido, custos menores etc. Se algum tema de pesquisa ou dúvida técnica surgir, não preciso incomodar ninguém… sempre tem alguém que postou um tutorial ou uma dissertação sobre o tema no Google. Hoje em dia, aprender é muito mais fácil.”
Você já está planejando seu segundo filme de ficção?
“Estou esperando o resultado do Edital da Ancine através do qual vou desenvolver, com uma equipe, 5 roteiros novos de longa-metragem, já em fase de sinopses. Para a Indústria Imaginária (minha produtora), é importante trabalhar com uma carteira de projetos.”
Com o que você se diverte no Rio, ultimamente?
“Cinema, amigos, cinema, amigos, e ler jornal porque as notícias do Brasil são atualmente tão absurdas, que chegam a ser surrealmente engraçadas.”