Na vida de Washington Olivetto, um dos publicitários mais premiados do mundo, nem tudo foi um comercial de margarina, até porque as mensagens pasteurizadas não fazem parte do currículo desse corinthiano fanático, mas, se há uma coisa que Olivetto sabe, além de vender ideias, é usar bem a sua sorte – não parece pouca!
Libriano, nascido em 29 de setembro, dia de São Miguel Arcanjo, tido como o dia do anunciante, ele sempre teve orgulho do pai, um vendedor, mas queria escrever profissionalmente. “Defendo a tese de que todo mundo nasce para fazer uma coisa bem feita, mas são poucos os que descobrem qual é essa coisa”, diz.
Olivetto percebeu, na adolescência, que queria fazer publicidade – unindo sua admiração pelo pai e sua vocação – e, um dia, quando o pneu do carro furou em frente a uma agência, ele entrou e pediu emprego, fazendo propaganda de si próprio. “Isso é uma grande oportunidade para vocês porque o pneu não fura duas vezes na mesma rua.”
Chairman da WMcCann desde 2010, Olivetto, pai de três filhos (Homero, Antonia e Theo), já ganhou mais de 50 Leões no Festival de Cannes, foi considerado uma das 25 figuras-chave da publicidade pela revista inglesa “Media International”, mas mantém o entusiasmo do início. “A minha melhor campanha foi a que fiz ontem”, fala. Os comerciais “Primeiro Sutiã” (1987), para a Valisère, e o filme “Hitler” (1989), para a Folha de São Paulo, são os únicos brasileiros na lista mundial dos 100 maiores comerciais de todos os tempos, mas o consumidor ainda tem na memória muitas outras peças com a sua assinatura, como o S de Sadia e os comerciais com Carlos Moreno, o garoto-propaganda da Bombril. “Foi com essa campanha que introduzi a linguagem coloquial na publicidade”, afirma.
Muito mais coisa aconteceu na trajetória intensa de Washington: além de ter sido tema de um livro (“Na toca dos leões”), de Fernando Morais, o publicitário escreveu seis. Sua agência virou música de Jorge Benjor (W/Brasil) – quem não conhece? – e segue feliz no casamento de mais de 20 anos com Patricia Viotti.
“Sou um avião consertado em pleno voo”, ele gosta de dizer, sobre o seu jeito de ir fazendo e aprendendo. Não é à toa que é chamado de gênio por alguns, citado como exemplo por outros, dono de raciocínio fresco e personagem muito lembrado pela ética. Leia sua entrevista:
A situação atual do Brasil está trazendo algumas mudanças nas grandes agências como a sua?
“Todas as agências estão tendo um ano dificílimo, sejam grandes, sejam pequenas. A minha WMcCann, por exemplo, que é a terceira maior agência do País, apesar de este ano não ter perdido nenhum cliente e de ter ganhado a grande LATAM, vai fechar 2015 com o seu pior resultado desde 2010, ano da sua fundação”.
Você já disse inúmeras vezes que a propaganda política “é um dinheiro muito bom de não ganhar”. Nunca teve, realmente, um político a quem admirasse? Não toparia fazer uma campanha chamando os políticos brasileiros a ter mais responsabilidade, mais ética?
“Tenho alguns políticos que admiro e tenho, inclusive, alguns políticos que são meus amigos pessoais, como o Jaime Lerner. Mas nunca sonhei nem aceitei fazer campanha política. A questão de mais responsabilidade e mais ética dos políticos é algo muito maior, que, lamentavelmente, uma simples campanha de publicidade não tem condições de resolver”.
O que um publicitário deve fazer quando não acredita no produto? Respirar fundo e ir adiante?
“Deve não trabalhar para esse produto”.
O que o irrita mais nessa onda de politicamente correto? Tem algum anúncio seu que, se fosse feito hoje em dia, não seria bem visto?
“Não tenho dúvidas de que existem vários anúncios meus e de outros publicitários tidos como obras-primas da publicidade mundial que hoje seriam contestados e combatidos pelos fanáticos do politicamente correto. O do “Primeiro Sutiã”, por exemplo, talvez fosse acusado de exaltação à pedofilia”.
Como o publicitário lida com essa tendência de consumo consciente, de diminuir a necessidade de compra? Você alguma vez, na sua juventude, se sentiu atraído pela filosofia hippie??
“O consumo consciente é bom para o consumidor, para as empresas e para os publicitários. Temos que ter consciência de que consumo é bom, muito bom; mas consumismo é bobagem, idiotice. Aos 18 anos, eu tinha o cabelo até o ombro, vestia jardineira sem camisa e calçava tamancos. Era um hippie, mas um hippie de boutique, porque já trabalhava em publicidade e ganhava um bom salário. Estava, portanto, totalmente dentro do sistema”.
Como você lida pessoalmente com as ferramentas digitais? O que acha de Facebook, Instagram, Twitter, Periscope, Snapchat?
“Adoro tecnologia, mas não sou deslumbrado com ela. Tive um dos primeiros blogs do Brasil. Fiz a primeira agência informatizada do país, a W/Brasil, que foi também a primeira a ter um site. Na WMcCann, temos todas as ferramentas digitais, até porque somos a agência digital de grandes clientes, como a Microsoft. Somos a única agência que monitora em tempo real todas as mídias existentes.Eu me utilizo bastante das ferramentas da agência, mas me poupo pessoalmente para não me expor em exagero. Mando no dia a dia muitos e-mails e utilizo o WhatsApp e o Viber eventualmente. Uso também alguns aplicativos quando viajo, como o Uber em NY (nos dias de
mau tempo, senão, caminho) e o Tube Map em Londres, quando o trânsito está engarrafado.
Você acha que o negro está mais bem representado na publicidade brasileira, ou não evoluímos muito nesse sentido?
“O negro está mais bem representado na publicidade do que já foi, mas ainda menos representado do que deveria ser”.
Tem algum tipo de produto que você nunca tenha feito anúncio e que gostaria de fazer?
“Existem novos produtos que eu gostaria de anunciar, produtos que estão surgindo agora, decorrentes do mundo digital. Produtos que são novidades na vida das pessoas e que podem ser novidade na minha vida profissional. Sou um novidadeiro, me realimento disso”.
O publicitário é mesmo vaidoso? Ainda tem publicitário que gosta de se vestir de maneira excêntrica?
“Seres humanos são vaidosos e eu, sinceramente, não sei definir o que é se vestir de maneira excêntrica porque esse é um conceito muito amplo. Particularmente, gosto de quem tem um estilo próprio, não só de se vestir, mas também de se comportar e de viver”.