A perda de Norma Bengell, embora irremediavelmente esperada, tem um lado oculto, pouco falado: a morte em vida da atriz e cineasta, descrita por todos como inesquecível – uma ironia para quem foi esquecida quando mais precisava do público e da máquina que tanto lucrou com seu talento.
Linda, sensual, forte, Norma Bengell rompeu barreiras e tabus; no início da década de 1960, ”causou” como a primeira atriz a fazer nu frontal no Brasil (em “Os Cafajestes”, de Ruy Guerra). Ex-modelo, cantora e vedete, foi a Hollywood e a Cannes, onde era comparada a Brigitte Bardot (fez “O Pagador de Promessas”, único filme nacional já premiado com a Palma de Ouro). Também desafiou a ditadura militar, que a prendeu inúmeras vezes, e seguiu em frente. Só de filmes, foram mais de 60, como atriz e diretora. Continuou dando sua enorme contribuição para a cultura nacional até enfrentar o revés que viria a determinar sua falência financeira, física e moral. Como produtora de “O Guarani” (1996), foi questionada pelo Tribunal de Contas da União e teve os bens bloqueados pela Justiça, por suspeita de lavagem de dinheiro. Provou sua inocência, mas não teve como recuperar-se da perda material e dos contratos de trabalho que deixou de assinar.
Nos anos que se seguiram, parecia que a memória de Norma havia sido pulverizada. Ainda descobriu ter sido roubada pelo contador e passou a vender os móveis de casa para ter o que comer. Adoeceu, ficou presa a uma cadeira de rodas, vivia triste. E sozinha. Vez ou outra, recebia ajuda através de um mutirão de amigos e artistas. Para que tenha uma despedida digna, os primos conseguiram da Prefeitura do Rio um auxílio para o velório e a cerimônia de cremação. Essa foi Norma, uma brasileira.