Foi nosso último encontro. Estávamos na fazenda e fazia um belo dia de outono, quando perguntei: “Mãe, posso fazer uma foto sua?” Ela usava um vestido estampado bem de camponesa mesmo. Olhei para o resto do figurino e pensei em oferecer trocar os meus brincos de brilhantes em formato de pera pelos seus, em ouro amarelo – só para aquele instante.
Pensei rápido e, antes que o fizesse, achei que soaria falso naquela situação. Desisti. Não combinava. Acho também que tive receio de minha mãe se apaixonar pelos meus brincos e eu ter que presenteá-la. Fiquei um pouco envergonhada, de mim pra mim. Pensei, quantas cabeças de gado valeriam aquelas pedras? Gado é uma moeda frequente na cabeça de meu pai, que não estava por perto – éramos só nós duas.
E voltei toda a intenção para a foto. Em dois ou três segundos concluí que, de alguma maneira, tudo ali ficava bem entre si. A beleza da natureza ao redor contribuía muito. Talvez até pela falta de harmonia. Pela simplicidade, principalmente.
Seu cabelo também não estava bonito, quando sugeri: “Usa esse chapéu que está ao seu lado”. Ela teve dúvidas, perguntou se realmente seria preciso: “Já sei, meu cabelo está horrível”, disse. Minha mãe sempre colocava defeitos em si mesma achando que caberia aos outros desmenti-los e trocá-los por elogios. E quando isso acontecia, ela ficava muito feliz. Elogio e água sempre tiveram mais ou menos a mesma importância em sua vida. Era quase uma razão de sobrevivência. Depois de dar atenção a tantos detalhes, talvez desnecessários, fiz as fotos. Quando as olhamos na tela da câmera, rimos muito.
Chegou a hora de voltar para a cidade e, ao nos despedirmos, com a espontaneidade que tinha para pedir qualquer coisa a qualquer um, ela disse: “Manda logo o meu retrato”. No avião, reparei em cada particularidade daquelas fotos e descobri numa pessoa que eu conhecia tanto, um olhar tão enigmático, tão indefinido, tão indecifrável…que me lembrei da Mona Lisa. Nessa hora, vieram a mim pensamentos sobrenaturais: como é que Leonardo da Vinci capturou o olhar de minha mãe para aquele quadro sem nunca tê-la visto?
Me dei conta de que a cena no campo tinha sido daquelas que, ao acontecer, a gente não percebe sua importância, vai surgindo aos poucos e parece que se redimensionando. Como algo tão banal entre mãe e filha vai mudando assim? Cada vez que voltava à minha cabeça, parecia maior, ampliado. Ampliei também o tamanho das fotos, só não me dando conta de que a luz da manhã, registrada ali ao fundo, estava começando, e a vida terminando. Aliás, um dia daqueles, com tanta brisa, com tanta luminosidade, poderia prenunciar tudo, menos a morte. Mas era o que estava a caminho. Ou essa criatura temida e mal intencionada já estaria espreitando nosso momento tão particular? Quem sabe até rindo das nossas bobagens. Não, a morte não ri. Mas o que isso importa agora?
Quanto aos brincos, não os tenho mais – fui roubada!